segunda-feira, 14 de junho de 2021

Geração Beat

 




Na década de 80, os autores Bueno e Goés lançaram o livro O que é Geração Beat pela editora Brasiliense. 

 Eles definem o estilo beat como “textos em ação, prosa espontânea, frases do corpo em movimento, poesia brotando como visões do céu e do inferno, ligação direta da arte e da vida, da palavra e do corpo”. Assim é a literatura beat, palavras intensas que batem de frente com o conformismo. Os beats criaram não só um novo mundo literário, como mostraram aos leitores uma nova forma de vida, liberdade e vontade de mudança.


Quando falamos de Geração Beat, três nomes são destaque: Jack Kerouac, William S. Burroughs e Allen Ginsberg. Esses foram os autores mais importantes, considerados líderes da Geração. Outros nomes importantes são: Gregory Corso, Carl Solomon, Lawrence Ferlinghetti e outros.

William S. Burroughs, ao contrário de Kerouac, não utilizava a prosa espontânea. Ele ficou conhecido como A Farmácia Ambulante da Geração Beat, devido à grande quantidade de drogas que já havia consumido até seus 30 anos de idade. Seu primeiro livro foi Junky, mas seu romance mais famoso é Almoço Nu. O próprio Burroughs disse em uma entrevista à revista espanhola Quimera que Almoço Nu foi escrito por insistência de Kerouac: “Foi ele quem me animou a escrever quando não me interessava realmente fazê-lo. Mas quanto à influência, em nada me sinto perto dele”.

Um fato curioso sobre a vida de Burroughs é que durante uma bebedeira ele pediu que sua esposa colocasse um copo em cima da cabeça para que ele pudesse atirar no mesmo. O problema é que ele errou o tiro, assassinando‑a. Ele também esteve no Amazonas na década de 50 em busca da yagé, que segundo ele era a “droga definitiva”. Almoço Nu ganhou uma adaptação para o cinema e foi lançado no Brasil sob o título Mistérios e Paixões, com direção de David Cronenberg.

Quando tratamos de poesia beat, temos ótimos nomes, mas o mais conhecido é sem dúvida alguma, Allen Ginsberg. Seu poema mais famoso chama-se Uivo. Esta obra pode ser considerado “o correspondente poético da prosa espontânea de Kerouac”. Sua poesia foi marcada por polêmicas, escrita em apenas uma tarde, ela nos mostra imagens sem sentido, nos remetendo também a Almoço Nu de Burroughs. Uma boa definição de Bueno e Góes para essa obra: “Marx transfigurado na poesia delirante de Blake, revolução e visão, revelação e transformação”.

Vários foram os escritores que influenciaram os beats, como Ernest Hemingway, Henry Miller, Mark Twain, Jack London, Thomas Wolfe, Walt Whitman, J. D. Salinger, entre outros. 

A Geração Beat também deixou sua marca, influenciandok Chuck Palahniu e Irvine Welsh, seja pela narrativa rápida ou pela escrita inovadora, que versam sobre o nonsense e a liberdade de expressão, sob todas as formas. 
No Brasil, alguns autores foram influenciados por eles, assim como Caio Fernando Abreu, Joca Reiners Terron, Jorge Mautner e José Agrippino de Paula.

Muito se fala da relação de Charles Bukowski com os beats. Apesar de escrever na mesma época e ter contato com alguns deles, ele não se considerava um. Ele é considerado o último escritor maldito da Literatura Norte-Americano, uma espécie de beat honorário. Bukowski também não tinha boas impressões de Burroughs, como narra a citação: “Apesar de tudo, verdade ou não, Burroughs é um escritor muito chato e, sem a insistência do pop instruído na sua bagagem literária, ele seria quase nada, (…)”.

On the road foi escrito à maneira de Kerouac, sem vírgulas, sem travessões, tudo de acordo com a velocidade de seus pensamentos. Assim é o manuscrito original. Para Kerouac, as vírgulas eram inúteis e os parágrafos pausavam a leitura de forma errônea. Kerouac costumava escrever suas obras em poucas noites. Para alguns escritores isso era um fato bastante inovador, enquanto que para outros, tal como Truman Capote, a escrita era um “mero ajuntamento de palavras sem nenhum valor literário”. Jack Kerouac foi sem dúvida alguma o principal escritor da Geração, o seu aclamado On the road foi para Geração Beat o que O sol também se levanta de Hemingway foi para a chamada Geração Perdida. O livro é conhecido como “a bíblia da geração beat”. Tudo que os beats viviam e eram está personificado na obra. Allen Ginsberg aparece no livro como Carlo Marx, Burroughs como Bull Lee e Neal Cassady, como Dean Moriarty.

O enredo consiste basicamente numa versão literária da vida de Kerouac e dos beats. Kerouac aparece como Sal Paradise, escritor que vive em busca de novos sentidos para a sua vida. Cassady é Dean Moriarty, e juntos eles atravessam os EUA através da famosa Rota 66, que liga o leste e o oeste do país. Juntos, também chegam ao México. O livro nos traz sentimentos, emoções, aventuras, drogas, sexo, mulheres e jazz. Todo o inconformismo de Kerouac com o “sonho americano”. O país havia saído da Segunda Guerra, a contracultura tomava conta das ruas e da arte, e Kerouac não queria saber de nada daquilo, queria seu mundo, sua liberdade.

Os efeitos que On the Road causou são muitos ao longo dos anos. Especula-se que Bob Dylan fugiu de casa depois de lê-lo, assim como Chrissie Hynden, dos Pretenders. O livro impulsionou Beck a se tornar cantor e Jim Morrison a fundar sua banda, The Doors. Marlon Brando mostrou interesse em interpretar Dean Moriarty no cinema, mas desistiu logo depois dizendo que o personagem era repetitivo. Francis Ford Coppola deteve os direitos do filme até 2006, quando foi divulgada uma nota dizendo que Walter Salles iria dirigir a versão para o cinema. Gus van Sant e Johnny Depp também já demonstraram interesse na versão cinematográfica do livro.


Quem foi Neal Cassady? Esse nome é estranho para muitas pessoas, inclusive para estudiosos de literatura. Talvez ele seja mais conhecido pelo pseudônimo que ganhou no livro On the Road: Dean Moriarty. Ele foi o companheiro de aventuras de Sal Paradise, ao longo da Rota 66. Paradise era ninguém menos que o próprio Kerouac. Juntos, eles cruzaram os EUA, chegaram ao México, experimentaram diversos sentimentos de amor e ódio e conheceram pessoas diferentes. Algumas passagens do livro apontam uma certa tensão sexual entre os dois, levando o leitor a crer que tiveram algum tipo de envolvimento dessa natureza. Depois, cada um seguiu seu rumo: Kerouac terminou seus dias na casa de sua mãe, sofrendo de cirrose; Cassady morreu de causas desconhecidas, mas especula-se que ele teve problemas nos rins.

Cassady escreveu apenas um livro chamado O Primeiro Terço, publicado pela editora LP&M aqui no Brasil, que deixou inacabado. Nele, conta a trajetória de seus familiares, desde seus avós, até chegar a certos acontecimentos de sua infância. Ele tinha muitos irmãos e seus pais se separaram quando ele ainda era muito novo. Apesar de seu pai ser alcoólatra, Cassady demonstra muito carinho por ele ao longo de sua escrita.

Ele não escreveu como Ginsberg e tão pouco como Burroughs, sua escrita em quase nada se assemelha com o estilo próprio dos beats. Ele não criou um clássico da literatura, mas foi muito sincero ao escrever suas recordações. Sua prosa se diferencia da de Kerouac, não é tão corrida, beirando o romance histórico. Ao fim do livro encontramos algumas cartas que ele trocou com Kerouac e, ali sim, sentimos a intensidade beat. Ele expressa seus sentimentos, seus delírios e sua ânsia de correr o mundo.

Ele pode não ter tido tanto destaque como escritor, mas sua figura ficou marcada para sempre. Um exemplo disso é que em certo episódio do seriado Lost, Ben (interpretado por Michael Emerson) se hospeda num hotel sob o nome de Dean Moriarty. Na literatura de Arthur Conan Doyle, há o Professor Moriarty, inimigo de Sherlock Holmes. Teria Kerouac se inspirado nesse personagem para criar seu Dean?

Se fosse necessário descrever a literatura de Cassady em apenas uma palavra seria: honesta. Deve ter havido certa pressão para ele escrever, visto que todos os seus companheiros produziam obras a todo instante, mas para o leitor é algo natural. Vemos o passado daquele que se tornou um ícone de liberdade, mudanças e inquietação. Infelizmente, poucos são os relatos que ele deixou.




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