- Não pode ser-disse o senhor Sousa ao filho, o
Ernestinho de oito anos.
– Mas, papá, eu vejo nos filmes. Todos têm
– afirmou a criança, à procura de uma salvação para aquilo que lhe parecia um desejo
certo.
– Onde é que já se viu um leão em casa?
Só nessasfitas idiotas. E, alem disso, o me ino não vê que não há espaço? Para a sema na arranjo-lhe um gato bonito, daqueles que
bebem leitinho e fazem miau.
O Ernestinho desistiu de convencer o pai. Para quê? Era um
homem com bigode, sempre a explicar o que não era preciso. Nem
sequer percebia de leões. Sentou-se no chão a pensar. Com certeza
que devia haver um leão ali em casa. Aquilo não era a vassoura
atrás da porta, nem a cadeira larga da mãe dormir aos domingos,
nem sequer o embrulho do lixo à espera de ser deitado fora. Foi
investigar, toda a gente sabe que os leões estão onde menos se espera.
Na cozinha, lá ao fundo. estava o caixote vazio que trouxera as
compras da Cooperativa. O Ernestinho pousou-lhe a mão, acariciou-o com ternura e um certo receio. O caixote rugiu e sacudiu a areia amarela e antiga que lhe aquecia a juba. O menino puxou-o
ao de leve, como quem ensina e
acompanha, e o caixote seguiu-o. pisando firme. O Ernestinho
sentou-se no chão da sala. Entre o sofá e a mesinha da televisão
o caixote ficava mesmo bem, confortável, como na caverna onde
nascera e dera o primeiro rugido.
– Agora vamos caçar, Baluba – explicou o Ernestinho ao caixote.
– Que faz o menino aí com esse caixote? – perguntou severamente o senhor Sousa, abrindo a porta, de sobrolho franzido.
O menino olhou para o pai, assustado, e depois para o seu amigo Baluba.
– Mata o velho, Baluba! – gritou, num desespero.
O leão saltou
veloz e, com uma única dentada eficaz, arrancou a cabeça do senhor Sousa.
Nenhum comentário:
Postar um comentário