segunda-feira, 19 de julho de 2021

Ele brigou com a esposa. Anton Tchekhov



– Mas que inferno! Você chega em casa do trabalho, faminto como um cão, e só o diabo sabe como te alimentam! E você ainda não pode reclamar! Se reclama, na mesma hora: choro, lágrimas! Que eu seja excomungado três vezes por ter me casado! Dito isso, o marido jogou com força a colher no prato, levantou-se de um salto e saiu furioso, batendo a porta.

A esposa começou a soluçar, cobriu o rosto com o guardanapo e saiu também.

Acabou-se o almoço.

O marido foi para o seu gabinete, atirou-se no divã e enfiou o rosto numa almofada. “Foi o demônio que te empurrou para casar!”, pensou ele. “Que maravilha, a vida de casado! Deus me livre! Mal uma pessoa se casa, já quer suicidar-se!”

Um quarto de hora depois ele ouviu uns passos leves atrás da porta...“É, é sempre assim... Me ofende, me insulta, e agora fica andando na frente da porta, querendo fazer as pazes... Ora bolas! É mais fácil eu me enforcar do que fazer as pazes!”

A porta se abriu com um leve rangido e não se fechou. Alguém entrou e, com passos leves e tímidos, dirigiu-se ao divã.

“Deixe estar! Pode pedir perdão, suplicar, soluçar... Figa para você! Nem pensar! Pode morrer, que não ouvirá uma palavra minha... Estou dormindo, como vê, e não quero conversa!”

O marido enfiou ainda mais o rosto na almofada e ficou roncando baixinho. Mas os homens são tão fracos quanto as mulheres. Eles amolecem e ficam mansos com facilidade. Ao sentir um corpo quente atrás de suas costas, o marido, por teimosia, moveu-se para mais perto do encosto do divã e encolheu a perna.

“É, agora estamos nos achegando, nos encostando, adulando... Daqui a pouco ela vai dar beijinhos no meu ombro, vai ficar de joelhos. Não suporto esses dengos! Apesar disso, vou ter de perdoá-la. No estado dela, faz mal ficar nervosa. Vou torturá-la um pouquinho, como castigo, depois perdoo...”

Ele ouviu bem perto do ouvido um suspiro profundo. A seguir, um segundo e um terceiro...

O marido sentiu no ombro o roçar de uma mãozinha.

“Bom, deixa pra lá! Vou perdoar pela última vez. Chega de torturá-la, coitadinha! Ainda mais que a culpa foi minha! Fiz um barulhão por uma besteira...”

– Está bem... já chega, minha pequena!

O marido esticou o braço para trás e abraçou um corpo quente.

– Eca!! Ao seu lado estava deitada sua enorme cadela Dianka.

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