quarta-feira, 30 de junho de 2021

Reencontro inesperado Johann Peter Hebel

 


Em Falun, na Suécia, beijavam-se, há bons cinqüenta anos ou mais, um jovem mineiro e sua jovem e bela noiva. E ele disse: “No dia de Santa Lucia nosso amor será abençoado pela mão do sacerdote. Então seremos marido e mulher e construiremos nosso próprio ninho de amor. ” – “E Paz e Amor lá viverão”, disse a bela noiva com um doce sorriso, “pois você, você é tudo para mim, e sem você eu prefiro estar num túmulo a estar em outro lugar. ” Mas, antes do dia de Santa Lucia, quando o padre, pela segunda vez, os chamou à igreja e aos fiéis perguntou: “Alguém tem algo a dizer que impeça a união desse casal? ”, anunciou-se, então, a morte. Assim, quando, na manhã seguinte, o jovem rapaz saiu de casa em seu traje negro de mineiro, vestido como sempre com sua mortalha, bateu como de costume à janela de sua noiva, disse-lhe bom dia, porém, não mais boa noite. Ele nunca mais voltou da mina, e ela que bordava, naquela manhã, um cachecol negro com barras vermelhas, como presente de casamento, deixou de lado o cachecol, chorou por seu amado e nunca mais o esqueceu. Enquanto isso, a cidade de Lisboa foi destruída por um terremoto, a Guerra dos Sete Anos entre Inglaterra e França e seus aliados chegou ao fim, o Imperador da Áustria Franz o Primeiro morreu, a Ordem Jesuíta foi revogada, a Polônia dividida, a Imperatriz da Áustria Maria Theresa morreu, Struensee, médico iluminista da corte dinamarquesa, foi decapitado, os Estados Unidos tornaram-se um país livre, a coligação entre franceses e espanhóis não foi capaz de conquistar Gibraltar, os turcos, na Hungria, encurralaram o general Stein na Caverna Veterani, o Imperador da Áustria Joseph também faleceu, o Rei da Suécia Gustavo conquistou a parte russa da Finlândia, a Revolução Francesa e sua longa guerra começaram, o Imperador da Áustria Leopoldo II também foi para o túmulo, Napoleão conquistou a Prússia, os ingleses bombardearam Copenhague e os lavradores semeavam, ceifavam e colhiam. O moleiro moía, o ferreiro martelava, e os mineiros cavavam em busca de metais em sua mina. No entanto, em Falun, antes ou depois do dia de São João, quando os mineiros iam começar a cavar uma abertura entre dois eixos, bem a uns trezentos metros do solo, eles avistaram o corpo de um jovem, bastante embebido em sulfato de ferro; e quando o retiraram dos escombros e sulfatos ferrosos, viram que o corpo estava incorruptível e inalterado, o que permitia reconhecer facilmente sua feição e idade. Era como se tivesse falecido há uma hora ou como se tivesse adormecido enquanto trabalhava. Porém quando o trouxeram à luz, não havia mais ninguém que pudesse reconhecê-lo, pai e mãe, parentes e conhecidos, há muito já haviam falecido, ninguém conhecia o jovem adormecido ou algo do seu infortúnio, até que apareceu a ex-noiva do mineiro, que um dia descera para o seu turno e nunca mais voltara. Grisalha e encurvada, chegou à praça, apoiando-se em uma bengala e logo reconheceu seu noivo; e demonstrando maior sentimento de alegria que de dor, debruçou-se ao lado do corpo do amado. Assim, quando se recuperou de uma longa e forte agitação emocional disse “é o meu amado”, e por fim, “por quem sofri por cinqüenta anos, e que Deus me permite ver mais uma vez, antes que eu mesma parta. Oito dias antes de nosso casamento, ele foi para debaixo da terra e nunca mais voltou. ” Os corações de todos ao redor foram tomados de tristeza e lágrimas quando viram a ex-noiva, agora idosa e cheia de rugas, e o noivo ainda com sua beleza jovial e também como, depois de cinquenta anos, a chama do amor da juventude mais uma vez despertara em seu peito. Mas o amado nunca mais abriria a boca para sorrir ou os olhos para reconhecê-la. Finalmente, ela solicitou aos mineiros que o levassem ao seu pequeno quarto, sendo o jovem o único bem que a ela pertencia e sobre ele tinha direito, até seu jazigo estar preparado no cemitério, e os mineiros voltarem para buscá-lo. Então, abriu e retirou de uma caixinha o cachecol de seda negra com a barra de listras vermelhas, colocou-o em volta do pescoço do amado e depois o acompanhou vestida em sua roupa dominical, como se fosse o dia de seu casamento e não do funeral de seu amado. Quando o colocaram no túmulo ela disse: “Agora repouse um ou mais dez dias nesse frio leito nupcial, e não se aborreça. Resta-me pouco para fazer e já volto, e em breve o dia renascerá. Aquilo que a terra concedeu mais uma vez, não irá pela segunda vez guardar”, disse ela, enquanto se afastava e o olhava mais uma vez.

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